Por Frank Willian para O cinecropcista
Confesso que nunca havia assistido A fantástica fábrica de chocolate nem o original de 1971 e tão pouco o remake do Tim Burton. Personagens como Willy Wonka nunca me desceram bem, sua presença intrigante, dualística, com expressões de má intenção disfarçada em um sorriso falso, tudo me causa tão profunda agonia que prefiro me abster. Mas aceitei a sugestão como desafio e cá estou eu para falar dessa fábula fantasticamente realista. Acredito que o filme dispensa apresentações, e talvez eu tenha sido o último a assistí-lo, portanto, vamos à dissecação. De cara, a direção de arte e a fotografia nos joga na tela a diferença que as crianças vencedoras apresentam com o Charlie Bucket. A humildade e pobreza do garoto são escuras e sombrias perto dos espalhafatosos e coloridos estilos de vida das outras crianças. Todas elas apresentam distorções comportamentais que refletem uma criação sem muitos estímulos morais aceitáveis. Augutos Glump é um glutão descontrolado, Veruka Salt é uma mimada egoísta, Violet Borregar é competitiva e ambiciosa e Mike Teevee é um teimoso soberbo. Note que os adjetivos comuns às crianças mal educadas são seguidos de adjetivos mais pesados que expõem características cruéis de imagens que não se atribuem à crianças. Essa é a crueldade da fábula, o lúdico e o fantástico dá espaço para uma crítica moral apegada demais à realidade para se deixar amenizar por imagens eufêmicas. As crianças são corrompidas, deturpadas e sujas demais para sequer desfrutar das experiências sensoriais fantásticas que a fábrica pode proporcionar, não há deslumbres, encantos e surpresa, somente reclamações, ambição, desconfiança e possessão. O único que tem os olhos corretos para tudo é o humilde Charlie Bucket, que, não pela romantização da pobreza, mas pela riqueza familiar, tem toda aptidão para vivenciar aquele momento através da perspectiva correta. Por fim, o excêntrico Willy Wonka. Posso dizer que finalmente o entendi como uma criatura tão sutilmente dicotômica. Ele é a resposta para as ações imorais das crianças, por meio dele, todas são punidas, sofrendo consequências de seus próprios atos sob o julgamento frio do dono da fábrica. Ele não demonstra nenhuma empatia, preocupação ou interesse, muito pelo contrário, ele as despreza. Por outro lado, Willy Wonka é sensível e frágil, amargurado com feridas abertas acerca de seu passado e sua família. Ao decorrer do filme percebemos como traços de sua infância marcaram tão profundamente sua vida e como a sua relação com sua família e seus ideais moldam seu presente. É nesse ponto que Willy Wonka foca ao levar o comportamento das crianças e seus ideais familiares como parâmetro para reconhecer um possível herdeiro. O final feliz se dá quando as próprias construções dos paradigmas familiares do Sr.Wonka são confrontados com os ideais de amor que o pequeno Charlie lhe apresenta, fazendo-o aprender que mesmo diante de seus traumas, a mudança é algo possível, principalmente depois da punição, quando criamos história o suficiente para medir nossos princípios e reinventá-los.
A fantástica Fábrica de Chocolate não é uma doce fábula infantil, mas assim como um chocolate amargo nas mãos de quem os aprecia, pode ser bastante recompensador.
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