top of page

O Fardo das Pedras

Por Jonatas Perote, Maracaçumé/MA, 17 de setembro de 2025.

ree

Ao longo dos milênios, a pedra ajudou o homem a erguer civilizações. Sempre esteve na base de tudo. Ligou o efêmero ao eterno. Serviu de caminho entre cidades, fez-se de pirâmide, templo, pórtico. Sustentou alicerces, garantiu segurança. Até Cristo utilizou-se metaforicamente dela para dar base a uma das maiores e mais longevas religiões do mundo.

A pedra, apesar de sua rigidez, guarda ranhuras e registra o passar do tempo. Serviu de folha em muitos momentos, vejam o decálogo e as inscrições egípcias. O relógio de areia? Pura pedra marcando passagens. Instrumento de poder ou arte. Testemunhou conflitos e selou pactos. Sólida. Resistente. Cortante. Cinzenta. Luzidia.

Drummond viu em suas retinas fatigadas uma pedra no meio do caminho. E veja que ele estava habituado a enxergá-las em Itabira, através da cinzenta paisagem da cidade. Adélia Prado, sem o tear poético, enxerga pedra, às vezes, ao invés de poesia. Pura crueza dos dias áridos, cheio de tormentos e sem encanto. Manoel de Barros ousou ser pedra, primeira coisa a esquentar-se com os raios solares. Esse, via beleza no cotidiano mais simples e ternura nos quintais.

Mas não são apenas as pedras exteriores e empoeiradas que são importantes. Todos carregamos, no íntimo, as nossas. Algumas com os contornos arredondados e suaves, leves lembranças que exibimos como souvenir na estante da alma. Outras são pontiagudas, que deixamos quietas ao fundo do baú, pois sua natureza perfurocortante, machuca a nós e aos outros. E em nosso alforje, levamos os erros que fomos cometendo ao longo do caminho, pela frieza da desatenção, ou pelo calor do momento… 

Nunca saberemos que pedras carregam o silêncio do outro, nem se se tornaram pontes ou pesos. Se são caminhos para os pés ou laços de morte ao pescoço.

E, de forma curiosa, não são as grandes pedras que nos fazem tropeçar. Essas ao longe mostram logo seu contorno. Circundamos, evitamo-la… Mas as pequenas… As pequenas é que são o problema: nos rins, no caminho, no sapato, na lembrança, na consciência, sobretudo, nessa.

Em nossa silenciosa caminhada, carregamos muitas pedras. Difícil saber quais alicerçam nossa frágil existência e quais nos arrastam para o abismo. Se são pontes ou muros. A ponta final da esperança ou a entrega atroz ao desesperançar. Trôpegos, seguimos adiante. 

Não esqueçamos, elas são peso e ponte. Corrida e cadência. Pressa e paciência.

Fardos da travessia.

Sobre o autor


Jonatas Perote é poeta, professor e habita o espaço entre o silêncio e o papel. Formado em Filosofia, encontra na escrita um modo de expurgo e resistência. Cada palavra, para ele, é uma tentativa de aliviar o peso do que não se diz — ainda que o vazio sempre retorne mais denso. Compartilha sua literatura no Instagram (@jonatasperote), onde lirismo, dor e contemplação existencial se entrelaçam. Tem obras publicadas pela Editora Frutificando, onde também assina esta coluna. Autor de "O Sopro do Vento e outras Poesias".



O Sopro do Vento e outras Poesias
Comprar

6 comentários

Avaliado com 0 de 5 estrelas.
Ainda sem avaliações

Adicione uma avaliação
actavoli
01 de out.
Avaliado com 5 de 5 estrelas.

Sensacional. Podemos ficar horas e horas refletindo sobre o assunto e devemos sempre lembrar, como diz o autor, que "elas são peso e ponte. Corrida e cadência. Pressa e paciência. Fardos da travessia."

Curtir

Avaliado com 5 de 5 estrelas.

"Nunca saberemos que pedras carregam o silêncio do outro, nem se se tornaram pontes ou pesos. Se são caminhos para os pés ou laços de morte ao pescoço." Para refletir por muito tempo sobre. Sempre pontual, Jonatas. Parabéns!

Curtir

Jane
18 de set.
Avaliado com 5 de 5 estrelas.

Perfeito. ❤️

Curtir

Convidado:
17 de set.
Avaliado com 5 de 5 estrelas.

Estou encantada!

Curtir

Convidado:
17 de set.
Avaliado com 5 de 5 estrelas.

Maravilhoso!

Curtir
NOVA LOGO FRUTIFICANDO (14).png

©2018 - 2025 Editora Frutificando - Edição, publicação e venda de livros

CNPJ 50784002000174 | Estrada dos Bandeirantes, 27238 | Vargem Grande | Rio de Janeiro -RJ | Brasil.

​Todos os livros têm frete enviado por registro módico, via Correios.

O prazo de envio (postagem) é de 15 (quinze) dias úteis, quando o livro já saiu da pré-venda. Enviamos para qualquer CEP no Brasil. Livros que não temos no estoque, terão acrescentados em seu tempo de envio mais 10 (dez) dias úteis, para que possam ser impressos. Não enviamos encomendas para fora do Brasil.

 

Site criado com muito ♥ pela designer editorial @jana.l.o.u

"Só eu conheço os planos que tenho para vocês: prosperidade e não desgraça e um futuro cheio de esperança. Sou eu, o Senhor, quem está falando." Jeremias 29:11

Atendimento de segunda a sexta, das 8h às 18h

Selo6_30Dias_0.75x.png
  • Facebook
  • Instagram
bottom of page